quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Paciente vinte e dois!



Seu Gregório



O seu Gregório não sabe de nada. Esqueceu dia da semana, o mês, o ano, enfim, totalmente desorientado no tempo e espaço. Vive em uma casa, um abrigo. A cada seis meses algum dos dois filhos aparecem para visitá-lo.
Entrou contente no consultório, sendo auxiliado por duas moças funcionárias do abrigo, trazendo sua tomografia computadorizada do crânio nas mãos. Elas estavam muito preocupadas com o velhinho,  o cérebro dele e a perda de memória, apesar de que às vezes o melhor mesmo é esquecer...
Abri a tomografia, seu cérebro tinha "encolhido" e havia algumas áreas de isquemia (sem oxigênio, mortas). Então, expliquei para as acompanhantes o que havia na tomografia, a atrofia cerebral, as áreas de isquemia e por consequência, a perda de memória. O Senhor Gregório que até então não se lembrava de nada, perguntou: " -Como? O que é?".  As duas olharam para ele e falaram ao mesmo tempo sem combinar: "- Nada Seu Gregório, nada Seu Gregório! Está tudo bem! Está tudo bem!"  Ele olhou para mim e eu confirmei: "- Está tudo bem Seu Gregório, está tudo bem! Não deu nada... Você só precisa tomar um remédio para memória"
Porque eu falaria alguma coisa, primeiro o velhinho está muito contente na casa de abrigo, nada mais importa... Depois, não sei se ele entenderia, acredito que sim, mas é algo totalmente dispensável essas explicações para um velhinho sem memória... O que eu vou falar? Seu cérebro está horrível! Enquanto a alma dele está feliz e contente?  
Por curiosidade, para entender porque o cérebro dele estava daquele jeito, perguntei para as acompanhantes:
"- Ele já teve AVC?". Elas falaram: "- Não doutora, não doutora!" Olhei para ele, e ele afirmou que não! Disse: "- Ele bebia bebida alcoólica?" Elas responderam: "- Parece que sim doutora, coisa leve..." Então ele virou para mim e falou: "- Doutora eu começava o café da manhã com pinga! E depois era o almoço, o jantar..." Elas ficaram espantadas, e ele começou a chorar, elas foram amorosas o abraçando... E disseram: "- Ai doutora, ele é tão querido... Ele é tão bonzinho! Então eu disse: Não chore Seu Gregório! Está tudo bem! O Senhor já não parou de beber? Ele disse: "- Sim parei"! E porque o senhor bebia? Perguntei. Então ele disse: "- É que os amigos bebiam e eu bebia também”! Fui ao embalo!”. 
E o Seu Gregório foi embora, todo feliz, dizendo que ama o lugar onde mora, que cuidam muito bem dele, e vive alegremente! E que tudo está bem!
A vida é engraçada, não sei se ele era feliz antes, mas agora, ele é: velho, pobre, sem filhos por perto, mora em um abrigo, não sabe que dia, nem mês, nem ano, nem dia semana é, mas é feliz!
Nessa vida tudo é relativo, tudo pode ser visto de vários ângulos, agora entendo, não há certo ou errado, há circunstâncias e o ser humano... 


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