quinta-feira, 24 de maio de 2012

O telhado e o milagre!





O Telhado e o Milagre!

Eu chamei pelo nome, meu paciente entrou Sr. Manuel.  Ele tinha boa aparência, apesar das rugas dos seus setenta e dois anos. Quando ele começou a falar com seu sotaque de estrangeiro percebi logo que era um cidadão português, talvez agora um “portobrasileiro” ou um “brasiportuguês” o famoso “portuga”!  Ele tinha várias semelhanças com meu pai que também é português, que também tem setenta e dois anos, que também tem no nome completo “Manuel”. Olhei para seu Manuel e pensei: “- Meu pai está assim!”. Falo isso porque conforme convivemos diariamente com as pessoas e se a amamos parece que elas nunca envelhecem... Então fiz a pergunta crucial: “- E como está seu Manuel, o senhor melhorou?”. E para minha surpresa, porque tenho que a impressão que todos nós procuramos um bem estar milagroso que talvez não exista... Ele disse: “- Sim doutora, eu estou ótimo!”. Eu fiquei feliz, um velhinho sem queixas é raridade!
O problema dele é que ele havia perdido um filho e desde então adoeceu, ficando com tontura e dores na cabeça. Feito todos os exames nada foi encontrado tudo estava normal. Prescrevi uma medicação para melhorar os sintomas e agora ele tinha melhorado ao ponto de me dizer que a tontura tinha passado e que ele tinha até conseguido subir no telhado! Imagina só, falar para uma neurologista que ele havia subido no telhado com setenta e dois anos! Eu engoli seco, tamanha era minha vontade de lhe dar uma bronca, mas me segurei porque ele estava tão feliz de ter realizado aquela façanha que eu poderia estragar seu momento de felicidade... Eu falaria no final da consulta: “- Cuidado, não é certo subir no telhado... O senhor pode cair e fraturar algum osso e seu destino vai ser a cadeira de rodas... Deixe o telhado para os jovens subiram, ou talvez os gatos que têm sete vidas...!”.
Então foi no meio da consulta que ele me avisou que ele era o paciente que havia me trazido o lenço milagroso ungido na igreja dele. Ele queria saber de algum milagre que pudesse ter acontecido comigo. Então disse: “- Senhor Manuel, não atribuí nenhum milagre que me tenha acontecido ao lenço milagroso. O lenço está lá, pendurado no quadro de avisos no meu quarto. Eu estou esperando o milagre...”. Eu senti que ele ficou desapontado, esperava um grande milagre. Ao mesmo tempo, pensei que não poderia dizer que não houvesse ocorrido um grande milagre em minha vida, como minha irmã sempre diz: “-No news is good news (nenhuma notícia é uma boa notícia)...”.  E então conclui para o senhor Manuel: “- Na verdade não sei senhor Manuel, talvez tenha ocorrido sim algum grande milagre com o lenço em minha vida que eu não tenha consciência disso... A vida é cheia de mistérios, mas o lencinho está lá no meu quarto, um dia ainda conto um grande milagre, ou a minha própria vida seja o milagre...”


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